ILUSÃO DE TEMPOS SIMPLES É comum o descendente de pioneiros de nossa cidade se deixar seduzir por ideias caducas. Ele alimenta ilusões do passado que jamais voltarão a existir. Essa geração das décadas de 1940 a 1960, hoje homens feitos, terceira idade e idosos, está ativa e comanda a cidade. Há uma constatação a que pouca atenção se dá. Dela não surgiu nenhum elemento marginal, fora da lei, ladrão, assassino, desocupado. Ainda desse tempo, raríssimos são os relatos de suicídios, de abandono do lar pelo marido, de mães entre as menores de 14 anos. Pode-se dizer, com segurança, que é uma geração virtuosa. Alguns enriqueceram. Outros tiveram relativa prosperidade, outros, filhos de operários e de gente simples, atingiram o nível universitário. Significa que houve progresso porque passaram a ter vida melhor que a dos pais. Não é a questão material que mais conta nessa história. Se assim fosse, somente os que ficaram ricos seriam a medida do progresso. Evidentemente, não se mede o progresso dessa forma. Da comunidade original para a sociedade atual, os ricos representam cerca de 0,1 % de nossa população. O avanço real está no progresso moral humano, na formação de cidadãos íntegros, honestos, cumpridores das obrigações, isentos de atitudes antissociais. Essas características estão presentes na nossa geração de 1940/1960, independente do ganho econômico e financeiro de cada um, desde o mais simples ao abastado. Naquele tempo não se pagava aluguel. Todos eram funcionários da empresa do Doutor Tozzi, trabalhavam no hotel, na fonte ou no engarrafamento, moravam nas casas da empresa. A rua Santo Antonio é um símbolo comunitário desse tempo. Exceção à regra apenas os que residiam na zona rural. Não havia creche e muitas mães trabalhavam. Os filhos ficavam aos cuidados carinhosos das avós ou de uma tia mais jovem. Dinheiro, ninguém tinha. Não se andava com dinheiro no bolso. As festas, religiosas ou não, eram organizadas pela própria comunidade. À medida que o sistema econômico Tozzi perdia a hegemonia, novas oportunidades de trabalho vieram e, com muito sacrifício, surgiram as primeiras casas próprias de trabalhadores. O núcleo urbano e o Sertãozinho, atual Bairro Bela Vista, surgiu desse modo. O sucesso da geração contou com um fator primordial, hoje estudado pela neurociência, chamado de “conceito de resiliência” que é a capacidade de superar adversidades. Ela se desenvolve nos primeiros anos de vida, antes mesmo da educação primária. É o que se denomina de “nicho sensorial”, ou seja, o ninho onde o bebê desenvolve a capacidade cerebral. O ambiente do lar é o elemento estimulante cerebral dos bebês. Pais infelizes ou antissociais agravam e retardam a inteligência. Se isso ocorrer, a professora, provavelmente, encontrará um mau aluno. É o nicho sensorial vivido pela geração 40/60 o responsável imediato pelo sucesso. Hoje se ele se encontra conturbado, é efeito, dos mais nocivos, da desigualdade social. As crianças, naquele tempo, viviam em ambiente comunitário pobre, mas contavam com a família trabalhadora, organizada e harmônica. Os que tinham pendores para os estudos se tornaram bons alunos, cursaram o ensino secundário e mesmo atingiram a universidade. Outros aprenderam ofícios e se desenvolveram em suas atividades. Hoje nas escolas as professoras encontram crianças com dificuldade para aprender e detectam que este fato advém de dificuldades psicológicas e sociais pela qual passam seus pais. A realidade é cruel. Sabe-se que um quarto das mulheres sofrem de depressão durante a gravidez. As causas de infelicidade da mãe são essencialmente devidas à precariedade social, dificuldades que se desdobram em violência conjugal. A criança já começa a ter seu cérebro danificado no útero, pois consome 3 a 4 litros de líquido amniótico ao dia para viver. Nele se encontram substâncias do estresse que se originam da mãe infeliz. É inconcebível a despreocupação negligente com a população lindoiense, com a ilusão de que ela produzirá automaticamente os mesmos resultados dos tempos simples do passado. Esse comportamento nos levará a conviver com o atraso e o desmantelamento social. Somente protegendo as mães, as crianças estarão protegidas. É o fio da meada de uma nova política pública, que conta com profissionais em medicina, educação e assistência social, articulados para construir uma nova face para Águas de Lindóia.