MULA SEM CABEÇA
África Central, Angola, Argélia, Camarões, Congo, Guadalupe, Guiné, Mali, Marrocos, Mauritânia, Senegal, Togo e Tunísia conseguiram independência no Século XX. Essas 13 ex-colônias francesas forneceram 15 dos 23 jogadores, atuais campeões do mundo. A Seleção da França foi formada por 2/3 de jogadores imigrantes de dupla nacionalidade, do país onde nasceram e a francesa. "A África venceu a Copa do Mundo", disse Trevor Noah, um apresentador da televisão sul-africana. O comentário provocou reações na França, principalmente, entre políticos de extrema-direita, que já há tempos criticam a seleção por ter negros. A França é contra imigrantes. O chargista atento ao problema da imigração não deixou passar: desenhou o barco cheio de exilados trazendo a taça ao alto e a mão poderosa do colonizador a tomá-la. A lei de imigração na França causou revolta, greve e manifestação de repúdio de intelectuais como Jean-Marie Le Clézio, prêmio Nobel de Literatura. Le Clézio chamou a lei de "negação de humanidade insuportável". Marine Le Pen, candidata de extrema direita e segundo lugar nas eleições francesas de 2017, ainda considerou as medidas "insuficientes". Jair Bolsonaro, representante da extrema direita brasileira, segue o mesmo destino de Le Pen. Está destinado a segundo lugar nas eleições. Pretende revogar a Lei de Imigração, considerada por especialistas como uma das mais avançadas do mundo. Propõe a construção de um campo de concentração para exilados venezuelanos que entrarem no país. Seu desejo é ser comparado a Ronald Trump. O presidente americano, por sua vez, ordenou a separação de pais e filhos imigrantes e a prisão de 2.300 crianças entre 4 e 10 anos, desde abril passado. Os Estados Unidos conseguem o feito inédito de desumanidade, que é manter campos de concentração de crianças. Trump quer endurecer mais, pretende construir um muro para isolar os Estados Unidos do México. Jair Bolsonaro ainda não falou da construção de um muro que separe o Brasil da Venezuela. A ideia poderá constar de seu programa de governo. Bolsonaro é autor de frases difíceis de acreditar que tenham sido proferidas por candidato a presidente da república.
A cantora Preta Gil lhe perguntou certa vez o que ele faria se seus filhos se relacionassem com mulher negra, e ouviu a resposta: "Eu não corro esse risco, meus filhos foram muito bem educados".
No país que Bolsonaro pretende governar, 54% da população é composta de afrodescendentes (IBGE, 2014); é o segundo país de maior população negra do mundo, só a Nigéria está à frente do Brasil (Revista TV Escola – abril, 2000).
Em realidade a população brasileira é uma imensa seleção como a francesa, em termos étnicos. Não houve aqui a transposição direta da civilização inglesa ou espanhola, como aconteceu com o resto das Américas. A nação brasileira é uma civilização própria, 'morena tropical', como disse o antropólogo Darci Ribeiro. Ela se constrói sem preconceitos, com tolerância e sem guerra. Entres os candidatos a presidente nas próximas eleições, restarão competitivos Jair Bolsonaro, Geraldo Alckmin, Marina Silva, Ciro Gomes e Lula (se for candidato, senão, quem ele indicar). O candidato que pretende ser vitorioso necessita conseguir provar que pertence ao Brasil moreno tropical. Não sendo assim será folclore, o mesmo que o relinchar da mula sem cabeça, tem gente que acredita, mas são poucos.