A CRUZ DO CALVÁRIO

 A CRUZ DO CALVÁRIO

 

A mortandade no presídio de Altamira (29.07), 62 mortos degolados e queimados, virou conversa para pesquisa qualitativa.

“Todos presos deveriam ser mortos”, foi a manifestação espontânea. À mesma pergunta a resposta foi “SIM”. 6 em cada 10 pessoas manifestaram esse sentimento.

Em tese, o pensamento “bandido bom é bandido morto”, lema de campanha de Bolsonaro, faz parte da cultura. Coincide com a proporção de votos (83%) que obteve no segundo turno das eleições nesta Estância.

Um amigo lindoiense me disse que teve a curiosidade de perguntar à época do fatídico episódio do Massacre do Carandiru (1992). O resultado foi favorável que todos detentos devessem ser mortos.

Há evidência que a banalização e mesmo o incentivo à morte seja fenômeno geral.

Um exemplo foi notícia de imprensa. O ex-juiz de direito, Wilson Witzel (PSL), governador do Rio de Janeiro sobrevoou de helicóptero com atiradores de elite (sniper) para assistir à matança do alto de supostos bandidos nas favelas cariocas. Uma espécie de safari humano. Em assassinato recente de duas pessoas na Lagoa, zona Sul do Rio, o agressor, em estado de surto psicótico, foi ferido na perna pelo policial. Witzel declarou que se fosse ele atiraria na cabeça.

Ouvi de um conterrâneo de classe média que o roubo de uma bicicleta deveria ser punido com pena de morte.

Esse impulso que desdenha a condição humana, é próprio do homem bruto não civilizado, está presente nas declarações de governantes como Witzel, João Dória, principalmente, Bolsonaro e na boca do povo.

De duas uma, ou os governantes se rebaixaram ao nível do mundo do crime copiando o modo como agem ou a prática da violência na sociedade segue a lição diária ministrada pelos governantes. Nesse ciclo vicioso a paz na sociedade tem pouca importância.

A paz não dá votos, não tem apelo eleitoral. É necessário a ‘guerra’ permanente e tornar o regime de estado policial.

O resultado obrigatório para a população é conviver com o feminicídio contra esposas, companheiras, namoradas e amantes. A eliminação sumária nas periferias de bandidos e negros. A morte de moradores de rua e pessoas da comunidade LGBT. A matança indiscriminada de líderes sem-terra, Índios e religiosos. Atentados e violência nas escolas contra professores, alunos e funcionários. A frequente mortandade nos presídios. E por aí vai.

Não bastas tanta dor. O desejo é de um conflito amplo com morte de 30 mil pessoas, comunistas, socialistas, petistas e esquerdistas, como proclamou em campanha o presidente Bolsonaro.

Com esse sentimento o direito e a justiça foram esquecidos e promoveu as arbitrariedades de Moro e Dallagnol a se tornarem “justiceiros” revelados pelas denúncias da imprensa.    

A situação mostra, também, a fragilidade da religião para vencer o maior defeito humano, a morte provocada pelo próprio homem. Witzel é ‘terrivelmente evangélico’ como ele mesmo se diz. Deve estar respaldado no Levítico bíblico que prega a lei da retaliação, do olho por olho dente por dente. Os evangelhos cristãos de amor ao próximo estariam superados atualmente.

A taxa de homicídio no Brasil atingiu a 26,7, é das mais altas do mundo. A Síria, em guerra recente, apresenta a taxa de 2,23, (dados fornecidos pela ONU).  Aqui se mata mais que na guerra.

Homicídio - é indicador do grau de atraso civilizatório da população. Porque a vida, de modo geral, se torna relativa e sem valor civilizatório.

Do desrespeito à vida, por extensão, surgem os modelos de reforma trabalhista, previdenciária, permissão para desmatar as florestas, liberação do porte de armas e agrotóxicos, redução dos recursos para as Universidades, ensino e pesquisa, fim do mais médicos, minha casa minha vida, FIES, entre outros.

Há 519 anos, desde o descobrimento, o brasileiro vê a cruz da constelação no céu sem se saber que vive em imenso calvário.