Histerese e política vulgar
A população aqualindoiana foi surpreendida neste mês com a mudança do santo preceptor do Hospital Geral Dr. Francisco Tozzi. As Irmãs Franciscanas, que administraram o hospital por 64 anos, passaram o comando para São Camilo.
Na Câmara Municipal o vereador André Alves fez uma pergunta importante da tribuna: “Por que deixou chegar nessa situação?”. A frase deveria ser repetida como mantra, pois é índole brasileira fechar janela depois de roubada.
A dificuldade financeira sempre esteve presente na história do hospital. Desde o primeiro tijolo arrecadado pela dona Aracy Boucault aos dias atuais, atividade voluntária e eventos sociais ajudaram a garantir o funcionamento. O poder municipal fez os repasses possíveis. Ao dinheiro insuficiente para manter equipe própria foram as Irmãs Franciscanas os recursos humanos insubstituíveis.
Elas se cansaram, é a hipótese lógica. Como elástico de roupa de tanto ser esticado perde a força é irreversível, não volta ao normal. Este fenômeno é chamado na física de “histerese” e tem sido usado para explicar as questões de natureza econômica e social.
As Irmãs Franciscanas desenvolveram bom e inestimável trabalho na atenção hospitalar, criação de semi-UTI e instalação de tomógrafo para diagnóstico por imagem. São merecedoras de gratidão dos aqualindoianos.
A São Camilo, reconhecida instituição da área médico-hospitalar, representa a troca do elástico. É de se esperar avanço no atendimento à população.
O Hospital Dr. Francisco Tozzi, continuará como casa de misericórdia.
A procura tende a ser maior que a capacidade de atendimento, seja pelo aumento e envelhecimento da população, seja pelo número de necessitados de atenção com novas modalidades prevalentes de estresse, depressão, senilidade, Parkinson e Alzheimer.
São Camilo terá que fazer milagre para manter as contas em dia, como fizeram as Irmãs, ou sair pela tangente aderindo à teoria de mercado do Ministro Paulo Guedes cessando o atendimento pelo SUS e causar grande prejuízo à coletividade.
Essa realidade não é de Águas de Lindóia, é nacional.
Vive-se um ciclo vicioso. A baixa qualidade de vida provoca a doença. A doença aumenta os gastos públicos, diminui a arrecadação e investimentos públicos causando desemprego. O desemprego causa baixa qualidade de vida, fechando o ciclo.
No país com 50 milhões de pessoas no desemprego e em atividade informal, com zero de proteção social - CLT, Previdência, Seguro Saúde – o SUS tem aguentado as pontas em matéria de saúde.
Longos períodos de desemprego, (e não se tem ilusão que esse governo possa resolver), as pessoas perdem a capacidade de trabalhar. É o tal fenômeno de histerese social. Mercado não emprega. Sua natureza é financeira, bolsas de valores, ações, juros, rendas etc. não resolvem a questão.
A doença “corre de a par” com o desemprego.
O Brasil é o único país com mais de 100 milhões de habitantes que dá assistência médica gratuita à população graças ao SUS. Foi grande avanço civilizatório, enfatizou o Dr. Dráuzio Varella (Folha de São Paulo, domingo, 18), “Sem o SUS é a barbárie”, é o título do artigo.
Os aqualindoianos são atendidos no CONISCA, no AME de Amparo ou em Bragança Paulista para os casos de alta complexidade graças ao SUS.
O SUS é bancado pelo governo federal.
O governo segue o lema de 1964, “se é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”. Lá o atendimento médico acontece pagando convênio, o Obamacare ou Trumpcare. Há chance de imitar e surgir um “Jaircare” ou “Guedescare” em lugar do SUS.
Segundo Olavo de Carvalho, guru do Presidente, assim como a Educação e a Bolsa Família, o SUS é inspiração socialista e precisa ser desconstruído.
A eleição de 2018 foi cheque sem fundo e deu origem à política vulgar de fanfarronices, está claro como o dia.
Amanhã pode ser tarde demais e restará repetir a pergunta do vereador “por que deixou o Brasil chegar nessa situação?”